quarta-feira, 11 de agosto de 2010

LEIA E REFLITA...

Podem os educadores mudar a escola?

Danilo Gandin

Temos uma tradição legalista em nossas escolas. Ela se sustenta no modo de pensar que chamamos senso comum, isto é, naquilo que as pessoas acreditam sem pensar, naquilo que é repetido sem que se tenha um fundamento real para acreditar. Fiz uma comparação entre o meu ginásio, o ensino de 1º grau de meus filhos e o Ensino Fundamental que meus netos vão começar a sofrer em breve. Quase não há diferença entre 1950 e 2010: quase todos vão à escola, diminuiu o número de disciplinas, fala-se mais em coisas novas, há reuniões, congressos e “aperfeiçoamento”, mas o currículo, em sua base, segue o mesmo. Se perguntarem às professoras (também aos professores, pois ainda os há, embora poucos, o que constitui outra mudança escolar) quais os conteúdos de sua matéria, em qualquer série, elas responderão da mesma forma do Oiapoque ao Chuí. É claro que professoras e professores mais lúcidos – são muitos – sabem que isto é uma aberração. Mas são escravos da “legislação”.

Encontro por este Brasil afora muitos grupos de professoras e professores que pensam. Mas eles e elas são proibidos de pensar, pela pressão do cotidiano. E pela prática de muitas outras e muitos outros “educadores” que preferem ser pilotos de livro didático, passando um amontoado de informações desligadas da realidade e de que, em geral, todos já ouvimos falar, mas do que não nos lembramos mais a não ser de alguns itens que coincidiram com nossos interesses.
Não, não podemos mais, os educadores, realizar esta revolução que a escola necessita. Embora o Conselho Nacional de Educação e muitos outros organismos educativos que são “autoridade” digam que as escolas são livres, isto não é verdade. A escola é o campo mais vigiado da prática humana. Ai dela se tentar, além da sua prática de transmissão da cultura – e da cultura dominante – propor alguma alteração na hierarquia de valores! Ela é controlada pela lei. Mas, sobretudo, por regulamentos expedidos por órgãos inferiores e pela própria sociedade. Talvez a distribuição gratuita do livro didático, tão desejada, seja a principal maneira de constranger a escola. Mesmo que a reprovação e a evasão sejam um descalabro, elas são construídas propositadamente pela escola. Como se manteria a divisão em classes de outra forma?
Só uma ação governamental poderosa pode mudar a escola hoje. Mesmo sabendo que a mudança verdadeira só será possível por uma democratização real da sociedade – incluindo mais igualdade –, hoje pode a autoridade governamental transformar o currículo, para que a escola ajude as crianças a assumirem sua própria identidade, possam munir-se de instrumentos para participar na sociedade, possam assumir um compromisso social e tenham a vivência ligada à transcendência, pelo menos desenvolvendo a capacidade de ultrapassar seus interesses mais imediatos.
Fonte: http://zerohora.clicrbs.com.br/zerohora/ (09/02/2010)

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